Era uma vez quatro amigos. Eles se conheceram há pouco tempo. De idades (e vivências) variadas, vieram de diferentes lugares do Brasil e estão agora em Portugal. A história deles começou no início deste ano, quando ainda nem se conheciam. Todos se candidataram ao processo seletivo do doutoramento em Direito da Universidade de Coimbra e foram aprovados. Ainda no Brasil, viveram a ansiedade e sentiram na pele as dificuldades (burocráticas e emocionais) dessa, então, futura mudança.
Um deles, o qual conheço bem de perto, sentiu suas pernas tremerem e seu coração quase sair pela boca quando viu seu nome entre os aprovados. Quanto aos demais, não posso dizer o mesmo, mas se levando em consideração a mudança que isso implicaria em suas vidas, algo de parecido deve ter-lhes acontecido.
Por razões que só o destino conhece, a relação entre eles começou logo nos primeiros dias de convivência no doutoramento. Dentre mais ou menos sessenta doutorandos, eles logo se aproximaram e começaram uma incipiente amizade. A vida às vezes faz acionar um magnetismo que atrai aqueles que, por razões igualmente desconhecidas, deveriam de fato se aproximar.
De onde brota uma amizade? Sem que haja qualquer necessidade de convivência por razões de toda ordem (familiar, profissional,...), vemo-nos com uma imensa e satisfatória vontade de estar juntos e (con)viver momentos felizes e, por que não, também tristes com essas pessoas que, assim como tantos outros rótulos nessa vida, recebem a vulgar denominação de "amigos". Conheço uma pessoa que fala que "os amigos são os eternos namorados". Sempre achei essa frase sensacional, pois revela uma possibilidade de se compartilhar uma modalidade de amor que prescinde de sexo, cobranças, compromissos... Enfim, um amor gratuito, que se mantém pelo simples fato de se querer bem alguém, de se estar (e ficar) feliz com a sua presença. É certo que muitos exigem da amizade iguais retribuições que os namorados (por convenção) se exigem. Coisas que a psicanálise resolveria bem! Mas amizade boa, verdadeira, é gratuita. Existe porque o que une os amigos (verdadeiros) é apenas a vontade e o inexplicável magnetismo que a vida faz acontecer.
Mas voltando aos quatro amigos desta história, importante e interessante notar que eles poderiam não ter se aproximado. Aferir o porquê isso se deu vai além de qualquer ciência. Não é nessa área que isso se opera. Em pouco tempo, eles estavam se comunicando por celular (ops, telemóvel) e marcando encontros, jantares e viagens. Com mais alguns dias de convivência, criou-se aquilo que Lygia Fagundes Telles falava sobre o que acontece com os amantes (com o tempo vejo aquela frase que citei quase que como uma profecia): logo havia entre eles algo como que uma "estrutura da bolha de sabão". Algo frágil, sutil, delicado, que os envolvia, protegia e, ao mesmo tempo, não os impedia de serem livres para serem o que quer que desejassem. Se algo desse errado nessa empreitada, quando estivessem juntos, essa "estrutura da bolha de sabão" os protegeria como se fosse aço. Mas por inconsequência ou desídia, um leve toque os deixaria novamente expostos à radiação de uma vida sulfúrica e árida. Ciência realmente não é um campo de compreensão que se aplica aqui...
Essa estrutura cria igualmente uma cumplicidade que dá gosto de ver. Em pouquíssimo tempo passaram a falar de coisas que lhes eram igualmente engraçadas, (des)interessantes e banais. Estavam rindo de assuntos e pessoas de forma deliciosamente irresponsável. Passaram a se sentir íntimos e à vontade para, inclusive, ficar em silêncio entre eles. Ah, eu, particularmente, acho isso uma das melhores coisas em uma amizade verdadeira: a possibilidade de se ficar em silêncio perto de outra pessoa. Sem precisar se explicar e nem puxar qualquer assunto. Um silêncio que não constrange, mas conforta. Quando isso ocorre, a cumplicidade passa então a ser plena.
A história desses quatro amigos tem apenas um mês e meio. Já ouvi dizer que há amizades de uma vida inteira. Não duvido, pois conquistei amigos que tenho certeza absoluta que me acompanharão por toda a minha vida. Para esses quatro jovens, desejo igual sorte.
E o melhor de tudo: o que os une não exclui nem limita nada. É uma relação constantemente aberta, pronta para se tornar uma nova história. Quem sabe, daqui a um tempo eles contem para novos amigos que durante o doutorado "éramos seis", sete, dez... Afinal, o que todos nós desejamos dizer sempre (com peito aberto e mãos para cima a acompanhar o refrão) é "eu quero ter um milhão de amigos e bem mais forte poder cantar".
domingo, 20 de novembro de 2011
quinta-feira, 10 de novembro de 2011
Caramelos e sabores de infância
Em que será que pensava aquela senhora a jogar milho aos pombos na Praça da República? Avistei-a de longe e pude perceber em seu rosto um olhar distante e nostálgico. Era um fim tarde frio e com céu de nuvens cor de chumbo. Estranhamente no ar havia também o peso desse metal. Uma sensação de que a chuva estava prestes a desatar do céu e acabar com aquela névoa que rodeava a copa das árvores que circundam a principal praça aqui de Coimbra. Essa cena austera e peculiar me levou a parar e sentar em um banco próximo àquela senhora.
De onde eu estava, sem que eu a deixasse perceber que a fitava, constatei sua idade muito avançada pelos cabelos bem branquinhos e por sua pele, excessivamente vincada pelos efeitos dos anos. Vestia um tipo de casaco brocado e uma saia até o joelho. Os tornozelos inchados saiam de uns sapatos sem qualquer tipo de adorno ou enfeites. Cumpriam apenas a função de calçá-la. Desse mesmo modo como aparentava e se vestia, é possível encontrar outras senhoras assim aqui em Coimbra e em Portugal. Uma cidade e um país velhos, que sentem o peso de existirem por tanto tempo. Mas, pelos motivos que descrevi, aquela senhora, com um pequeno saco de milho na mão, despertou o meu interesse e a minha sensibilidade para refletir sobre o tempo.
Sua vida, naqueles instantes, passou a me interessar. Será que teve muitos filhos? Dava-se bem com eles (ou eles com ela)? Perdeu algum deles? Aquele olhar era mesmo de nostalgia (resignação), lembrando-se de tanta coisa (boa e ruim) vivida? Como será chegar a essa idade e não se ter mais todo o tempo do mundo pela frente, como é comum na mocidade?
Antes mesmo que eu parasse de fazer indagações inúteis e silenciosas à minha mente, ela se levantou com dificuldades, amassou o saco vazio de milho e, despertando-me do transe, o jogou sem qualquer delicadeza na lixeira. Foi-se embora vagarosamente, deixando-me para trás com minhas divagações de fim de tarde. Eu iria em seguida de ônibus para casa, mas preferi ir a pé. A despeito dos minutos que iria gastar caminhando, precisava desse tempo e desse esforço físico para me desfazer daquele estado reflexivo.
Depois percebi que realmente isso já aconteceu comigo e já ouvi muita gente dizer que morria de saudades do "cheirinho do bolinho da vovó", do "sabor delicioso de certo doce que só fulano fazia", do "tempo em que se podia fazer isso ou aquilo"... A propósito, acho que Woody Allen se inspirou nessa estória do "sabor de infância" para rodar seu novo filme "Meia noite em Paris".
Depois da conversa, pensei: quantos "sabores de infância" fazem-nos nostálgicos e nos impedem de desfrutar sensações e experiências novas, comparando-as sempre com os invencíveis e mágicos "sabores de infância". Resultado: frustração a se agregar no mar de outras tantas em que vivemos. Arrisco dizer que passado é bom até certa medida, e viver nele não é uma boa opção. O futuro tem que ser melhor, e essa fala (falível) deve ser sempre a do presente.
Mesmo os portugueses, que já dividiram o mundo (ao meio) com os espanhóis, tentam não mais viver do passado. Como todos sabem, eles estão numa crise sem tamanho. Tenho percebido que a vida não está nada fácil para quem vive por aqui. Outro dia, numa quitanda de bairro, ouvi dois senhores se cumprimentando. Um perguntou para o outro: "E aí, está bem?". Sendo-lhe respondido: "Ora, tem que estar!". Levando-se em conta a atual situação portuguesa, achei a resposta, metaforicamente falando, precisa e acertada!
Outro fato que se relaciona com essas reflexões sobre o tempo aconteceu na minha entrevista no serviço de imigração português para a obtenção do visto de residência. O funcionário, por incrível que pareça, foi muito simpático e atencioso comigo. Certa hora perguntei se com o cartão de residente que iria receber eu poderia ir a outro país da comunidade européia. Disse que sim, mas como não sou cidadão europeu, devo estar também com o passaporte. Em tom descontraído, disse que com ambos os documentos eu poderia tanto ir ao Brasil como ali na Espanha comprar caramelos.
Achei aquela comparação inusitada e perguntei se os caramelos da Espanha eram realmente bons. Eis sua resposta: "Devem ser sim, pois na época da ditadura aqui em Portugal, os portugueses, quando os guardas da fronteira descuidavam, iam à Espanha para comprar caramelos".
Indo para casa, no ônibus, pensei: se essa estória for verdade, o caramelo em si não deve ter sido motivo para se arriscar tanto. Talvez o que tornava o sabor do caramelo um "sabor de infância", suficientemente forte para aqueles que se arriscavam a atravessar a fronteira de um país em tempos de ditadura, teria sido a lembrança de um tempo em que se era livre e se tinha direitos, inclusive o de comer inofensivos caramelos.
O que as pessoas não fazem para adoçar a vida. Mas pensando bem, se não for assim, que gosto tem...
p.s. Acho que aquela senhora aproveitava o momento de jogar milho aos pombos para pensar nos "sabores de infância" de sua longa vida. Para ela, o futuro já não deve interessar tanto e o presente deve ser vagaroso como era o seu andar naquela tarde. De qualque forma, o que posso desejar é que sua vida tenha sido doce como os caramelos da Espanha.
De onde eu estava, sem que eu a deixasse perceber que a fitava, constatei sua idade muito avançada pelos cabelos bem branquinhos e por sua pele, excessivamente vincada pelos efeitos dos anos. Vestia um tipo de casaco brocado e uma saia até o joelho. Os tornozelos inchados saiam de uns sapatos sem qualquer tipo de adorno ou enfeites. Cumpriam apenas a função de calçá-la. Desse mesmo modo como aparentava e se vestia, é possível encontrar outras senhoras assim aqui em Coimbra e em Portugal. Uma cidade e um país velhos, que sentem o peso de existirem por tanto tempo. Mas, pelos motivos que descrevi, aquela senhora, com um pequeno saco de milho na mão, despertou o meu interesse e a minha sensibilidade para refletir sobre o tempo.
Sua vida, naqueles instantes, passou a me interessar. Será que teve muitos filhos? Dava-se bem com eles (ou eles com ela)? Perdeu algum deles? Aquele olhar era mesmo de nostalgia (resignação), lembrando-se de tanta coisa (boa e ruim) vivida? Como será chegar a essa idade e não se ter mais todo o tempo do mundo pela frente, como é comum na mocidade?
Antes mesmo que eu parasse de fazer indagações inúteis e silenciosas à minha mente, ela se levantou com dificuldades, amassou o saco vazio de milho e, despertando-me do transe, o jogou sem qualquer delicadeza na lixeira. Foi-se embora vagarosamente, deixando-me para trás com minhas divagações de fim de tarde. Eu iria em seguida de ônibus para casa, mas preferi ir a pé. A despeito dos minutos que iria gastar caminhando, precisava desse tempo e desse esforço físico para me desfazer daquele estado reflexivo.
Passados alguns dias, em conversa com meu amigo Ricardo, ele me falou de algo que me fez (re)pensar aquela tarde. Disse que sua mãe, volta e meia, alertava-o sobre um sentimento muito comum em todos nós, que é o de achar que certos gostos (cheiros/sabores/impressões...) do passado têm mais "encanto" que aqueles vivenciados no presente. Ela chamava esse fenômeno de "sabor de infância".
Depois da conversa, pensei: quantos "sabores de infância" fazem-nos nostálgicos e nos impedem de desfrutar sensações e experiências novas, comparando-as sempre com os invencíveis e mágicos "sabores de infância". Resultado: frustração a se agregar no mar de outras tantas em que vivemos. Arrisco dizer que passado é bom até certa medida, e viver nele não é uma boa opção. O futuro tem que ser melhor, e essa fala (falível) deve ser sempre a do presente.
Mesmo os portugueses, que já dividiram o mundo (ao meio) com os espanhóis, tentam não mais viver do passado. Como todos sabem, eles estão numa crise sem tamanho. Tenho percebido que a vida não está nada fácil para quem vive por aqui. Outro dia, numa quitanda de bairro, ouvi dois senhores se cumprimentando. Um perguntou para o outro: "E aí, está bem?". Sendo-lhe respondido: "Ora, tem que estar!". Levando-se em conta a atual situação portuguesa, achei a resposta, metaforicamente falando, precisa e acertada!
Outro fato que se relaciona com essas reflexões sobre o tempo aconteceu na minha entrevista no serviço de imigração português para a obtenção do visto de residência. O funcionário, por incrível que pareça, foi muito simpático e atencioso comigo. Certa hora perguntei se com o cartão de residente que iria receber eu poderia ir a outro país da comunidade européia. Disse que sim, mas como não sou cidadão europeu, devo estar também com o passaporte. Em tom descontraído, disse que com ambos os documentos eu poderia tanto ir ao Brasil como ali na Espanha comprar caramelos.
Achei aquela comparação inusitada e perguntei se os caramelos da Espanha eram realmente bons. Eis sua resposta: "Devem ser sim, pois na época da ditadura aqui em Portugal, os portugueses, quando os guardas da fronteira descuidavam, iam à Espanha para comprar caramelos".
Indo para casa, no ônibus, pensei: se essa estória for verdade, o caramelo em si não deve ter sido motivo para se arriscar tanto. Talvez o que tornava o sabor do caramelo um "sabor de infância", suficientemente forte para aqueles que se arriscavam a atravessar a fronteira de um país em tempos de ditadura, teria sido a lembrança de um tempo em que se era livre e se tinha direitos, inclusive o de comer inofensivos caramelos.
O que as pessoas não fazem para adoçar a vida. Mas pensando bem, se não for assim, que gosto tem...
p.s. Acho que aquela senhora aproveitava o momento de jogar milho aos pombos para pensar nos "sabores de infância" de sua longa vida. Para ela, o futuro já não deve interessar tanto e o presente deve ser vagaroso como era o seu andar naquela tarde. De qualque forma, o que posso desejar é que sua vida tenha sido doce como os caramelos da Espanha.
terça-feira, 1 de novembro de 2011
Um canto pra chamar de meu
Caso desejar, à direita há um player com uma canção ("A casa é sua"), que sugiro para acompanhar a leitura deste post, ou ao final dele, onde existe a transcrição de sua letra. Basta clicar no play assim que quiser ouvi-la.
Como parte dos primeiros desafios de me instalar em uma cidade como Coimbra, fiquei de relatar como se deu a minha busca por um apartamento para começar minha vida por aqui. Um estudante tentando encontrar um lugar para morar em uma cidade universitária: não sei de que maneira isso poderia se tornar um assunto de interesse geral (e não apenas de amigos próximos e familiares).
Mas essa preocupação inicial me motiva agora a tentar esgarçar essa experiência, ampliá-la para atingir também aquele que como você perde seu raros minutos a ler essas linhas de um relato amador. Mera pretensão, mas aceito o desafio de quem igualmente aceitar o convite de acompanhar essa banal experiência. Fechado? Vamos então à ordenha das pedras!
Talvez um bom começo seja pela força de um verbo cujo sentido é propriamente humano: morar. À exceção de tribos nômades (do deserto?), que acredito ser cada dia mais raro nesse planeta já pré-culturalmente-programado a que fomos lançados, todo mundo precisa de um canto pra chamar de seu, ter uma casa, um ambiente qualquer para viver.
Desde que nossos ancestrais saíram à procura de uma caverna para ter ali relativo conforto; para fugir das intempéries naturais como o frio, o calor ou a chuva; para procriar e abrigar sua prole indefesa; e nós, mais recentemente, para nos proteger de fenômenos sociais como a violência e a criminalidade; os motivos são inúmeros (e não param de crescer) para que tenhamos um lugar fixo (e emparedado) para viver.
E o meu motivo, nesse atual momento, como todos bem sabem, foi o de encontrar esse lugar aqui em Coimbra. Até então, era na casa do papai e da mamãe. Não me envergonho disso. Foram anos ótimos e felizes ao lado deles. Mas no Brasil há um famoso ditado que diz: "quem casa quer casa". Eu (ainda) não me casei, mas bem que poderia haver outro semelhante : "quem sai de sua casa para estudar (em Coimbra) quer casa".
E esse foi meu desejo durante os primeiros dias desde minha chegada. Não, não fiquei na rua até que isso acontecesse. Prudentemente, reservei alguns dias em um hotel para, nesse breve intervalo, ver in locu as possibilidades de estadia por aqui. Acompanhe comigo as minhas dificuldades.
Quando se atravessa um oceano para estar em um local onde se pretende morar, as coisas não tão fáceis quanto uma simples, mas não menos interessante, viagem de turismo. Tudo começa com um limite: os tradicionais dois volumes (malas) com 32 kilos cada. Para passar 10 ou 20 dias, mais do que suficiente (exceto para a crescente parcela de "muambeiros de luxo" vindo da Flórida. Sim, eu vi pessoalmente que eles existem aos montes). Mas para estar 1 ou 2 anos, não! O que levar nesses dois singelos volumes. Certamente todos os meus bens materiais móveis adquiridos ao longo de 36 anos não caberiam ali, apesar da vontade (e tentativa). Olhava desolado o que não coube ou não foi escolhido para entrar na mala. Mas apelei para o desapego!
Não tenho muita coisa, mas façamos um exercício (lembrem-se, vim para morar): roupas (incluindo casacos, calças, camisas, terno, etc), sapatos e tênis, livros, alguma roupa de cama e banho, notebook, arroz com feijão (não, estou brincando), etc, etc... Enfim, basta dizer que utilizei o limite permitido de bagagem!
E nesses primeiros dias aqui em Coimbra, tudo isso ficou dentro da mala, dentro do hotel. Não dava para abrir e colocar tudo no guarda-roupas, na pia do banheiro, ou seja, instalar-me. Com exceção das coisas que estrategicamente coloquei na parte de cima da mala, tudo ficou lá, enquanto eu batia perna tentando alugar um canto. Em alguns momentos, senti-me como meus pertences, espremido e sem ainda poder respirar nessa nova terra.
Coimbra, como todos sabem, é uma cidade universitária. Pela milenar lei da oferta e da procura, onde há muita gente querendo algo, os preços vão para as alturas. Ainda mais quando se chega nesse tipo de cidade logo após o início do ano letivo, que foi meu caso. Não sobrou muita coisa. Perguntando aqui, pedindo indicação ali, vendo os classificados acolá, fui tentando achar um lugar digno e limpo para eu ficar. Esses adjetivos não estão aí à toa, pois vi alguns lugares em que eles não se aplicavam.
De todo esse processo, aqui bem resumido, escolho relatar/compartilhar apenas três momentos pitorescos dessa empreitada. Duas tentativas frustradas e a, já adianto, feliz escolha de onde agora estou.
Bem, as duas tentativas (frustradas) foram frutos de anúncios de classificado de jornal. Ah, um detalhe do linguajar imobiliário português que tive que me acostumar: os apartamentos e as casas para alugar/vender são classificados de acordo com o número de quartos (ou dormitórios, como se diz em São Paulo). Até aí, tudo bem, mas há uma codificação que no início eu estranhei. Via anúncios como este: "Alugo T1 em excelente estado. 350Euros". Pois é, descobri depois que esse número se refere ao número de quartos existentes. Nesse sistema há, portanto, o T0 (sim, sem quarto, tudo no mesmo ambiente, como a nossa famosa kitnet), o T1 (um quarto em ambiente separado), o T2 (dois quartos) e por aí vai. Só achei estranho encontrar anúncios alugando um T1 + 1. Deve ser ignorância minha, mas por que não chamar de T2?
Bem, quando se olha anúncios de classificados, cada palavra adquiri um significado muito forte. Como o anúncio é vendido por caracteres, as palavras são estrategicamente escolhidas pelo anunciante para convencer o leitor a se interessar pelo "produto" anunciado. O problema é que essas palavras muitas vezes não refletem o real estado das coisas. E eu fui, inevitavelmente, vítima da má-fé de alguns anúncios.
O primeiro anúncio que me interessou foi de um T1 "impecável" na Rua do Brasil. Não preciso falar mais nada: na situação em que eu estava, "impecável" e "Brasil" foram muito impactantes. Mas, infelizmente, foi só decepção. Ao ligar para o senhor que anunciava, um primeiro obstáculo: eu não entendia quase nada que ele falava (aquele lance do português de Portugal/do Brasil). Com muito esforço, consegui marcar um encontro para conhecer o lugar. Onde? Na Rua do Brasil: uma das ruas mais tumultuadas e, desculpem a palavra, esculhambadas da cidade. Ai, tadinho do meu Brasil, até aqui... Mas..., já estava ali mesmo!
Então veio o tal senhor. O estereótipo que todos (a maioria, vai...) tem de um português: um senhor com bigodes enormes de fazer volta na ponta. Só faltou ele dizer que tinha uma padaria. Fui com ele ver o tal T1. Lembra que uma das palavras do anúncio que me chamou atenção foi "impecável". Decompondo a palavra: que não peca em nada. Se for assim, aquele apartamento era um herege sem perdão. Falei que iria pensar...e nunca mais vi o senhor Manuel da padaria!
O outro anúncio foi já mais para o final das tentativas. A paciência já estava acabando e fui ver no desespero mesmo. Outro T1, e nem tinha palavras impactantes no anúncio. A essa altura, sendo limpo já estaria ótimo. O que eu queria era sair daquele hotel e me instalar.
O dono da imobiliária veio me pegar no hotel. Um simpático senhor, agora de barba e bigodes aparados e com um português compreensível. Fomos conversando e, em determinada hora, comecei a achar estranho, pois a cidade estava ficando para trás. Chegamos então ao local, bem ermo e sem nenhum comércio nas imediações. O que havia de mais movimentado por perto era um ponto de ônibus, que nem era tão perto assim. Pensei de novo, já estou aqui mesmo...
O prédio por fora nem era de assustar, mas começando a subir as escadas (escuras) comecei a ficar com "medo". Chegamos ao terceiro andar. A dona morava no apartamento de frente. Um senhora falante que foi logo abrindo a porta e dizendo que naquele apartamento moravam duas brasileiras com as quais ela fez muita amizade. Disse que foi como uma segunda mãe para elas. Mas deixou claro que elas eram exceção à sua opinião sobre as brasileiras que vêm morar em Portugal. Segundo ela, a maioria vem para se prostituir e ela prefere, por isso, alugar os apartamentos para rapazes. Eu, pasmo, ouvindo...e ela continuou...evitamos, pois, quando se vê, elas estão com nossos maridos! Achei tudo aquilo de uma maldade e de um preconceito que nem deu vontade de continuar a ver o apartamento. E, pelo que consigo me lembrar, não atendia ao único requisito que ainda fazia questão. O apartamento era muito sujo, daquele tipo que tem crosta de gordura no fogão. Despedi-me brevemente e falei que iria pensar. Se eu pudesse, iria trazer uns amigos que conheço para morar lá. Só pra ela correr o risco de também ficar sem o marido e largar de ser preconceituosa. Pronto, falei!!!
Nesse dia minha moral ficou baixa. Pedi ao senhor da imobiliária que me deixasse próximo a um shopping movimentado e saí andando, à procura de placas de aluguel nas sacadas dos apartamentos da região. Depois de andar por quase uma hora e não achar nada, me senti desolado como a Janete, best friend da Valéria, cantando aquelas músicas tristes ao longo do metrô. Ah, a analogia é ruim, mas o quadro humorístico é muito bom e, lembrando disso naquela hora, até me alegrei de novo. Voltei para o hotel e reiniciei todo o processo!
Para não enfadar, chego logo ao momento em que achei o meu canto aqui em Coimbra. Por indicação de um amigo do doutorado (chama-se Ricardo. Ele e Cláudia, citada no segundo post, estão se tornando meus grandes amigos aqui), entro em contato com outra imobiliária. Ele tinha a disposição um T0 (que também é chamado de studio), em um prédio em cima de um grande shopping daqui, chamado Dolce Vita (que além de tudo, tem até um supermercado). Um lugar ótimo e perto de ponto de ônibus (ops, autocarro), ponto de táxi, de academia de ginástica (aqui ginásio), livraria, estádio de futebol, cafés, restaurantes... Faltava só conferir o apartamento pessoalmente.
Começou bem, portaria (com porteiro), elevador, tudo muito limpo, eu nem estava acreditando. Quando chego no apartamento, pensei: é esse! Pequeno, simples, mas tudo novo, limpo e funcional. Em um mesmo ambiente: cama (embutida), armários, cozinha (equipada com geladeira, fogão e microondas), sala com sofá e tapete. Em outro, o banheiro (limpíssimo e novo). Perguntei, posso me mudar hoje?
No outro dia minhas coisas já tinham saído de dentro da mala e com elas comecei a respirar aliviado. Enfim, tinha a minha casa. Agora "só falta ela ser um lar", como diz a música do poeta Arnaldo Antunes, que embala a leitura desse post. Tento fazer isso todos os dias. Ainda não tenho condições de receber amigos para jantares e trazer vida e animação a ela (limitações temporárias de pratos, talheres, copos...), mas assim que tiver, a casa deixará de ser só MINHA é passará também a ser SUA!!!
Afinal, algo que diferencia nossas casas das distantes cavernas de nossos ancestrais é a possibilidade de partilhá-la com aqueles que gostamos e amamos. Pois, como também diz a letra da música, de nada adianta cama, sofá, parede, janela, teto, banheiro, cachorro, relógio, tapete, cozinha, sem que haja pessoas (amadas e queridas) para alegrar e dar poesia a essas coisas que, por si só, não bastam!
p.s. Na verdade, este é um canto que eu gostaria para mim:
A casa é sua
Arnaldo Antunes
Como parte dos primeiros desafios de me instalar em uma cidade como Coimbra, fiquei de relatar como se deu a minha busca por um apartamento para começar minha vida por aqui. Um estudante tentando encontrar um lugar para morar em uma cidade universitária: não sei de que maneira isso poderia se tornar um assunto de interesse geral (e não apenas de amigos próximos e familiares).
Mas essa preocupação inicial me motiva agora a tentar esgarçar essa experiência, ampliá-la para atingir também aquele que como você perde seu raros minutos a ler essas linhas de um relato amador. Mera pretensão, mas aceito o desafio de quem igualmente aceitar o convite de acompanhar essa banal experiência. Fechado? Vamos então à ordenha das pedras!
Talvez um bom começo seja pela força de um verbo cujo sentido é propriamente humano: morar. À exceção de tribos nômades (do deserto?), que acredito ser cada dia mais raro nesse planeta já pré-culturalmente-programado a que fomos lançados, todo mundo precisa de um canto pra chamar de seu, ter uma casa, um ambiente qualquer para viver.
Desde que nossos ancestrais saíram à procura de uma caverna para ter ali relativo conforto; para fugir das intempéries naturais como o frio, o calor ou a chuva; para procriar e abrigar sua prole indefesa; e nós, mais recentemente, para nos proteger de fenômenos sociais como a violência e a criminalidade; os motivos são inúmeros (e não param de crescer) para que tenhamos um lugar fixo (e emparedado) para viver.
E o meu motivo, nesse atual momento, como todos bem sabem, foi o de encontrar esse lugar aqui em Coimbra. Até então, era na casa do papai e da mamãe. Não me envergonho disso. Foram anos ótimos e felizes ao lado deles. Mas no Brasil há um famoso ditado que diz: "quem casa quer casa". Eu (ainda) não me casei, mas bem que poderia haver outro semelhante : "quem sai de sua casa para estudar (em Coimbra) quer casa".
E esse foi meu desejo durante os primeiros dias desde minha chegada. Não, não fiquei na rua até que isso acontecesse. Prudentemente, reservei alguns dias em um hotel para, nesse breve intervalo, ver in locu as possibilidades de estadia por aqui. Acompanhe comigo as minhas dificuldades.
Quando se atravessa um oceano para estar em um local onde se pretende morar, as coisas não tão fáceis quanto uma simples, mas não menos interessante, viagem de turismo. Tudo começa com um limite: os tradicionais dois volumes (malas) com 32 kilos cada. Para passar 10 ou 20 dias, mais do que suficiente (exceto para a crescente parcela de "muambeiros de luxo" vindo da Flórida. Sim, eu vi pessoalmente que eles existem aos montes). Mas para estar 1 ou 2 anos, não! O que levar nesses dois singelos volumes. Certamente todos os meus bens materiais móveis adquiridos ao longo de 36 anos não caberiam ali, apesar da vontade (e tentativa). Olhava desolado o que não coube ou não foi escolhido para entrar na mala. Mas apelei para o desapego!
Não tenho muita coisa, mas façamos um exercício (lembrem-se, vim para morar): roupas (incluindo casacos, calças, camisas, terno, etc), sapatos e tênis, livros, alguma roupa de cama e banho, notebook, arroz com feijão (não, estou brincando), etc, etc... Enfim, basta dizer que utilizei o limite permitido de bagagem!
E nesses primeiros dias aqui em Coimbra, tudo isso ficou dentro da mala, dentro do hotel. Não dava para abrir e colocar tudo no guarda-roupas, na pia do banheiro, ou seja, instalar-me. Com exceção das coisas que estrategicamente coloquei na parte de cima da mala, tudo ficou lá, enquanto eu batia perna tentando alugar um canto. Em alguns momentos, senti-me como meus pertences, espremido e sem ainda poder respirar nessa nova terra.
Coimbra, como todos sabem, é uma cidade universitária. Pela milenar lei da oferta e da procura, onde há muita gente querendo algo, os preços vão para as alturas. Ainda mais quando se chega nesse tipo de cidade logo após o início do ano letivo, que foi meu caso. Não sobrou muita coisa. Perguntando aqui, pedindo indicação ali, vendo os classificados acolá, fui tentando achar um lugar digno e limpo para eu ficar. Esses adjetivos não estão aí à toa, pois vi alguns lugares em que eles não se aplicavam.
De todo esse processo, aqui bem resumido, escolho relatar/compartilhar apenas três momentos pitorescos dessa empreitada. Duas tentativas frustradas e a, já adianto, feliz escolha de onde agora estou.
Bem, as duas tentativas (frustradas) foram frutos de anúncios de classificado de jornal. Ah, um detalhe do linguajar imobiliário português que tive que me acostumar: os apartamentos e as casas para alugar/vender são classificados de acordo com o número de quartos (ou dormitórios, como se diz em São Paulo). Até aí, tudo bem, mas há uma codificação que no início eu estranhei. Via anúncios como este: "Alugo T1 em excelente estado. 350Euros". Pois é, descobri depois que esse número se refere ao número de quartos existentes. Nesse sistema há, portanto, o T0 (sim, sem quarto, tudo no mesmo ambiente, como a nossa famosa kitnet), o T1 (um quarto em ambiente separado), o T2 (dois quartos) e por aí vai. Só achei estranho encontrar anúncios alugando um T1 + 1. Deve ser ignorância minha, mas por que não chamar de T2?
Bem, quando se olha anúncios de classificados, cada palavra adquiri um significado muito forte. Como o anúncio é vendido por caracteres, as palavras são estrategicamente escolhidas pelo anunciante para convencer o leitor a se interessar pelo "produto" anunciado. O problema é que essas palavras muitas vezes não refletem o real estado das coisas. E eu fui, inevitavelmente, vítima da má-fé de alguns anúncios.
O primeiro anúncio que me interessou foi de um T1 "impecável" na Rua do Brasil. Não preciso falar mais nada: na situação em que eu estava, "impecável" e "Brasil" foram muito impactantes. Mas, infelizmente, foi só decepção. Ao ligar para o senhor que anunciava, um primeiro obstáculo: eu não entendia quase nada que ele falava (aquele lance do português de Portugal/do Brasil). Com muito esforço, consegui marcar um encontro para conhecer o lugar. Onde? Na Rua do Brasil: uma das ruas mais tumultuadas e, desculpem a palavra, esculhambadas da cidade. Ai, tadinho do meu Brasil, até aqui... Mas..., já estava ali mesmo!
Então veio o tal senhor. O estereótipo que todos (a maioria, vai...) tem de um português: um senhor com bigodes enormes de fazer volta na ponta. Só faltou ele dizer que tinha uma padaria. Fui com ele ver o tal T1. Lembra que uma das palavras do anúncio que me chamou atenção foi "impecável". Decompondo a palavra: que não peca em nada. Se for assim, aquele apartamento era um herege sem perdão. Falei que iria pensar...e nunca mais vi o senhor Manuel da padaria!
O outro anúncio foi já mais para o final das tentativas. A paciência já estava acabando e fui ver no desespero mesmo. Outro T1, e nem tinha palavras impactantes no anúncio. A essa altura, sendo limpo já estaria ótimo. O que eu queria era sair daquele hotel e me instalar.
O dono da imobiliária veio me pegar no hotel. Um simpático senhor, agora de barba e bigodes aparados e com um português compreensível. Fomos conversando e, em determinada hora, comecei a achar estranho, pois a cidade estava ficando para trás. Chegamos então ao local, bem ermo e sem nenhum comércio nas imediações. O que havia de mais movimentado por perto era um ponto de ônibus, que nem era tão perto assim. Pensei de novo, já estou aqui mesmo...
O prédio por fora nem era de assustar, mas começando a subir as escadas (escuras) comecei a ficar com "medo". Chegamos ao terceiro andar. A dona morava no apartamento de frente. Um senhora falante que foi logo abrindo a porta e dizendo que naquele apartamento moravam duas brasileiras com as quais ela fez muita amizade. Disse que foi como uma segunda mãe para elas. Mas deixou claro que elas eram exceção à sua opinião sobre as brasileiras que vêm morar em Portugal. Segundo ela, a maioria vem para se prostituir e ela prefere, por isso, alugar os apartamentos para rapazes. Eu, pasmo, ouvindo...e ela continuou...evitamos, pois, quando se vê, elas estão com nossos maridos! Achei tudo aquilo de uma maldade e de um preconceito que nem deu vontade de continuar a ver o apartamento. E, pelo que consigo me lembrar, não atendia ao único requisito que ainda fazia questão. O apartamento era muito sujo, daquele tipo que tem crosta de gordura no fogão. Despedi-me brevemente e falei que iria pensar. Se eu pudesse, iria trazer uns amigos que conheço para morar lá. Só pra ela correr o risco de também ficar sem o marido e largar de ser preconceituosa. Pronto, falei!!!
Nesse dia minha moral ficou baixa. Pedi ao senhor da imobiliária que me deixasse próximo a um shopping movimentado e saí andando, à procura de placas de aluguel nas sacadas dos apartamentos da região. Depois de andar por quase uma hora e não achar nada, me senti desolado como a Janete, best friend da Valéria, cantando aquelas músicas tristes ao longo do metrô. Ah, a analogia é ruim, mas o quadro humorístico é muito bom e, lembrando disso naquela hora, até me alegrei de novo. Voltei para o hotel e reiniciei todo o processo!
Para não enfadar, chego logo ao momento em que achei o meu canto aqui em Coimbra. Por indicação de um amigo do doutorado (chama-se Ricardo. Ele e Cláudia, citada no segundo post, estão se tornando meus grandes amigos aqui), entro em contato com outra imobiliária. Ele tinha a disposição um T0 (que também é chamado de studio), em um prédio em cima de um grande shopping daqui, chamado Dolce Vita (que além de tudo, tem até um supermercado). Um lugar ótimo e perto de ponto de ônibus (ops, autocarro), ponto de táxi, de academia de ginástica (aqui ginásio), livraria, estádio de futebol, cafés, restaurantes... Faltava só conferir o apartamento pessoalmente.
Começou bem, portaria (com porteiro), elevador, tudo muito limpo, eu nem estava acreditando. Quando chego no apartamento, pensei: é esse! Pequeno, simples, mas tudo novo, limpo e funcional. Em um mesmo ambiente: cama (embutida), armários, cozinha (equipada com geladeira, fogão e microondas), sala com sofá e tapete. Em outro, o banheiro (limpíssimo e novo). Perguntei, posso me mudar hoje?
No outro dia minhas coisas já tinham saído de dentro da mala e com elas comecei a respirar aliviado. Enfim, tinha a minha casa. Agora "só falta ela ser um lar", como diz a música do poeta Arnaldo Antunes, que embala a leitura desse post. Tento fazer isso todos os dias. Ainda não tenho condições de receber amigos para jantares e trazer vida e animação a ela (limitações temporárias de pratos, talheres, copos...), mas assim que tiver, a casa deixará de ser só MINHA é passará também a ser SUA!!!
Afinal, algo que diferencia nossas casas das distantes cavernas de nossos ancestrais é a possibilidade de partilhá-la com aqueles que gostamos e amamos. Pois, como também diz a letra da música, de nada adianta cama, sofá, parede, janela, teto, banheiro, cachorro, relógio, tapete, cozinha, sem que haja pessoas (amadas e queridas) para alegrar e dar poesia a essas coisas que, por si só, não bastam!
p.s. Na verdade, este é um canto que eu gostaria para mim:
A casa é sua
Arnaldo Antunes
Não me falta cadeira
Não me falta sofá
Só falta você sentada na sala
Só falta você estar
Não me falta parede
E nela uma porta pra você entrar
Não me falta tapete
Só falta o seu pé descalço pra pisar
Não me falta cama
Só falta você deitar
Não me falta o sol da manhã
Só falta você acordar
Pras janelas se abrirem pra mim
E o vento brincar no quintal
Embalando as flores do jardim
Balançando as cores no varal
A casa é sua
Por que não chega agora?
Até o teto tá de ponta-cabeça
Porque você demora
A casa é sua
Por que não chega logo?
Nem o prego aguenta mais
O peso desse relógio
Não me falta banheiro, quarto
Abajur, sala de jantar
Não me falta cozinha
Só falta a campainha tocar
Não me falta cachorro
Uivando só porque você não está
Parece até que está pedindo socorro
Como tudo aqui nesse lugar
Não me falta casa
Só falta ela ser um lar
Não me falta o tempo que passa
Só não dá mais para tanto esperar
Para os pássaros voltarem a cantar
E a nuvem desenhar um coração flechado
Para o chão voltar a se deitar
E a chuva batucar no telhado
A casa é sua
Por que não chega agora?
Até o teto tá de ponta-cabeça
Porque você demora
A casa é sua
Por que não chega logo?
Nem o prego aguenta mais
O peso desse relógio
Não me falta sofá
Só falta você sentada na sala
Só falta você estar
Não me falta parede
E nela uma porta pra você entrar
Não me falta tapete
Só falta o seu pé descalço pra pisar
Não me falta cama
Só falta você deitar
Não me falta o sol da manhã
Só falta você acordar
Pras janelas se abrirem pra mim
E o vento brincar no quintal
Embalando as flores do jardim
Balançando as cores no varal
A casa é sua
Por que não chega agora?
Até o teto tá de ponta-cabeça
Porque você demora
A casa é sua
Por que não chega logo?
Nem o prego aguenta mais
O peso desse relógio
Não me falta banheiro, quarto
Abajur, sala de jantar
Não me falta cozinha
Só falta a campainha tocar
Não me falta cachorro
Uivando só porque você não está
Parece até que está pedindo socorro
Como tudo aqui nesse lugar
Não me falta casa
Só falta ela ser um lar
Não me falta o tempo que passa
Só não dá mais para tanto esperar
Para os pássaros voltarem a cantar
E a nuvem desenhar um coração flechado
Para o chão voltar a se deitar
E a chuva batucar no telhado
A casa é sua
Por que não chega agora?
Até o teto tá de ponta-cabeça
Porque você demora
A casa é sua
Por que não chega logo?
Nem o prego aguenta mais
O peso desse relógio
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