quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Começou...

Enfim, tenho condições físicas e mentais de começar este blog, um espaço idealizado para ser o relato de uma experiência sabática: a realização de um doutorado – ou doutoramento, como se diz por aqui – em Direito, pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em Portugal.

Já o deveria ter começado há mais tempo, meio que no calor dos acontecimentos, mas as contingências e burocracias para a minha mudança de Vitória, no Espírito Santo/Brasil, para Coimbra/Portugal, foram deveras limitadoras de qualquer ânimo ou inspiração para ideias que fossem dignas de se compartilhar com outros leitores. Não que agora elas tenham tal qualidade, mas essa será uma constante intenção de uma mente agora  (+ ou -) sã.

O adjetivo “sabático”, para quem ainda não o conhece, refere-se a um período de afastamento das atividades regulares para a vivência de uma experiência diferente das que usualmente você desempenha no seu dia-a-dia. Dizem que isso é salutar e nos torna pessoas melhores. Estou embarcando nessa agora, ao final poderei dizer (ou sentir)!
Bem, minha ocupação principal relaciona-se ao cargo de Capitão da Polícia Militar do Espírito Santo. Para quem ainda não me conhece, espero que isso não seja motivo de rótulos ou estereótipos. A despeito do senso-comum, dê-me um voto de confiança. Pretendo postar (relatar), de forma despretenciosa, as minhas impressões, reflexões e experiências culturais, acadêmicas e, por que não, antropológicas vivenciadas neste país. Afinal, estarei em terras de nossos colonizadores (já descobri que eles não gostam muito desse termo), e será estimulante observar a cultura e o modo de vida português, conhecido por mim apenas dos livros de história e das anedotas populares.

Pois bem, agora, passada uma semana desde minha chegada a Coimbra, posso ver em retrospectiva as emoções e condições de minha mudança de uma forma mais clara e interessante. Passado o didatismo dessas linhas introdutórias, o objetivo destes tópicos iniciais é, portanto, relatar como foram os primeiros dias desde minha partida.

Após muitas festas e encontros de “despedida” com amigos e familiares, todas muito emocionantes (a sensação de ser querido por tantos fez-me sentir uma imensa felicidade!), quarta-feira, dia 04/10/2011 foi o dia “D”: minha partida!!!
De modo especial, marcou-me o momento em que, com as malas prontas, na sala de minha casa, encontravam-se a rezar eu, meu pai, minha mãe e minha avó materna, pessoas que amo, admiro e respeito para além de qualquer limite.  Os sentimentos eram tão verdadeiros (mal conseguíamos pronunciar as palavras)  que me senti de fato abençoado e protegido para enfrentar tudo o que viesse a ocorrer comigo a partir daquele momento.
Para tornar as coisas um pouco mais difíceis para mim, nesse dia chovia bastante em Vitória. Não a ponto de inviabilizar meu vôo, mas para me deixar com as emoções ainda mais a flor da pele. Na linguagem do cinema, a maioria das vezes em que se utiliza chuva nas cenas é para remeter o espectador a um clima/estado de melancolia. Não preciso dizer mais nada, havia sempre uma lágrima tendendo a cair. E em alguns momentos caíram mesmo. Piegas? Pode ser, mas, perdoem-me, poucas vezes me senti assim. Acho que tenho esse direito aqui!
E por falar em cinema, sempre me emociono ao (re)ver um filme chamado “Simplesmente amor”, de 2003 (a tradução deixa bem a desejar. No original: Love Actually). Ele termina com cenas de reencontros de pessoas no aeroporto. Não há palavras ou diálogos, apenas música e anônimos de muitas etnias se reencontrando no salão de desembarque de um grande aeroporto de Londres.

Sempre achei aeroporto um lugar paradoxal: um ambiente normalmente frio e tumultuado, mas com a emoção em suspenso no ar devido a despedidas e reencontros de gente querida. E lá em Vitória, no dia 04 de outubro de 2011, havia gente querida e amada a se despedir de mim. Senti a força e energia que sempre admirava naquele filme, agora em minha vida.
Bom, tirando esse lado lúdico, a melancolia da chuva e meu estado emocional, aeroporto volta a ser um lugar frio e tumultuado, e a cada dia mais. Poupo-lhes dos fatos desinteressantes de um vôo internacional. Não há mais o glamour de outrora. Nem vivi esse tempo para ser saudosista dessa forma, mas posso imaginar. E em nada deve se comparar a viajar hoje em dia. Aperto, desconforto, gente mal educada, falta de gentileza de comissários e passageiros, comida muito ruim, etc, etc. Sem esnobismos: ainda hei de ter dinheiro para viajar só de primeira classe!
Mas enfim, o vôo da TAP cumpriu sua função e me deixou em Lisboa, às 07:00h da manhã do dia 05 de outubro de 2011. Sem conhecer nada e ninguém, peguei minhas duas malas pesadíssimas (para viver pelo menos dois anos, imagina o que não levei...) e peguei um taxi para e estação de trem, de onde eu iria ainda viajar mais 2 horas até Coimbra. Sem ter dormido direito no vôo (estou ficando imune aos efeitos do Dramim), imaginem meu estado. Mas o que importa é que após quase 22 horas de viagem, cheguei (ou o que sobrou de mim) a meu destino final: Coimbra, a cidade muralhada, como dizem aqui.
Havia reservado uns seis dias de hotel para, nesse intervalo, conseguir um apartamento para alugar e me instalar definitivamente. Pensei que seria fácil; tremendo engano. Mas isso é um capítulo a parte. Na sexta-feira, dia 07, houve a aula inaugural do doutoramento. Começaram alguns problemas: como e onde passar meu terno?  Enfiado numa mala, imaginem a situação em que ele chegou. Solução: comprar um ferro de passar! Meu primeiro bem adquirido em Portugal.

Acho que esse primeiro post está ficando grande demais. Melhor parar. Deixa para o próximo o meu primeiro contato formal com a universidade (a aula inaugural) e minhas (des)aventuras para alugar meu primeiro apartamento em Coimbra. Sim, foram necessários 36 anos para que o jovem aqui saísse da casa dos pais para morar sozinho pela primeira vez. Ah, mas lá era tão bom...

13 comentários:

  1. Boa estada na terrinha amigo! Espero que retorne breve, renovado de forças e novos conhecimentos (seriam novas questões?) enfim, aproveite a estada. Um grande abraço do seu amigo e companheiro de briosa, Mauricio (06)

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  2. Pode até ter ficado grande. Mas fiquei preso e queria ler mais. Será muito importante para os que te gostam e até os que não, saber como é a vida na terra dos "colonizadores". Pois o que os livros, revistas, etc, nos mostram, não é a mesma coisa que vivenciar(literalmente). Estou aqui aguardando o próximo post. Tudo de bom sempre.
    Bruce Carvalho

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  3. Não ficou grande não,fiquei com gostinho de quero mais...
    Sei muito bem o que vc deve estar sentindo(em proporção menor)mas sinto isso todas as vezes que estou fóra do Brasil e quando mencionou a cena final de "simplesmente amor" que também é uma das minhas cenas preferidas de todos os tempos pela ternura e verdade e que me é recorrente quase toda a semana,desde então passei a observar pelos aeroportos do mundo o reencontro das pessoas,a anciedade e a explosão de alegria quando a pessoa esperada sai pelo portão de desembarque.
    É assim no mundo inteiro.
    E vou te confessar amigo,as vezes me pego procurando por alguém que sei que não está lá,mas mesmo assim dou uma olhada rápida,procurando alguém de braços abertos a Me esperar...mas nunca tem ninguém!!!
    No seu retorno amigo com certeza vão ter vários braços a te esperar e nesse momento você saberá que tudo valeu a pena...
    Um grande abraço,
    Gustavo Fernandes.

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  4. Ora pois.. pois... se já tens um ferro de passar, já tens vínculo com a terrinha.

    Ótima idéia do blog.. sabemos de vc e vc do Brasil.

    Ande a pé e descubra os cantos e recantos de Coimbra.

    Um grande abraço,

    Rosa Maria Campos

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  5. Seu primeiro post me levou às lágrimas. Deus te abençõe em toda sua caminhada aí! Ficamos no aguardo do próximo capítulo desta "sabática" aventura.
    Um grande beijo
    Sua prima, Priscila

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  6. Tudo e mais dificil no comeco, mas com certeza as coisas melhoram e se acomodam ao seu lugar com o passar do tempo, espero que essa experiencia sirva p/toda sua vida, aproveite ao maximo, viva intensamente essa nova etapa da sua vida! Tbm fiquei com gostinho de quero mais... Aguardo ansiosamente o proximo post! Good luck to you!
    Bjs,
    Roberta Rabbi

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  7. Queridos,
    Vocês não imaginam como essas mensagens são importantes para mim. Obrigado pelo carinho. Saudades de todos!!!

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  8. Querido primo, adorei sua ideia desse blog, estarei sempre aqui a buscar noticias suas. Beijos e seja muito feliz.
    só consegui postar como anonimo
    Maria Celia Abreu

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  9. Obrigado Célia,
    Tem sido muito prazero escrevê-lo. Mande um abraço a todos por aí. Beijos

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  10. não precisava ter mudado a expressão"o bonitão aqui" eu e sua mãe tinhamos comentado e gostado muito, afinal é bonitão mesmo.

    Celia Abreu

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  11. Silvagner,

    Tivemos breve contato no Grupo de Estudos de Hermenêutica (FDV) do Professor Alexandre Coura. Na época (2010-01) você finalizando o mestrado e eu querendo iniciá-lo. Agora, mestranda, volto os olhos ao Doutorado... na Europa.

    Li seu primeiro post e gostei muito. Ao final identifiquei-me com o escrito. Meu futuro doutoramento será, igualmente, a experiência de despedida da casa dos meus pais.

    Escreva mais! Quero acompanhar suas notícias!

    Sucesso!

    Grande abraço,

    Fernanda Brasileiro

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  12. Parabéns Silvagner.....em breve 3 sabiás irão cantar aí no seu ouvido.....nos aguarde...abração e ótimos estudos....Luiz Flávio

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  13. Belos textos......já está na hora de pensar em escrever seu livro....

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