quinta-feira, 8 de março de 2012

Sonhos de um dia de inverno

Anteontem fui ao cinema. Como fazia tempo que não entrava naquela caixa preta de ilusões e sonhos. Fui ver Hugo, um lindo meta-filme de Martin Scorsese sobre as origens do cinema, essa arte que tem o poder de nos fazer sonhar acordados. Pensando bem, o ritual é parecido: vamos para um lugar escuro, silencioso (cada vez menos...) e, ao invés de fechar os olhos e adormecer, vamos "para onde nascem os sonhos".

Sonhar acordado às vezes faz um bem danado. E para isso o cinema não tem rival. Dormindo também é bom, mas é que teimo em me esquecer dos sonhos e, além disso, não ter controle sobre eles me assusta um pouco (nisso o sr. Freud deve ter algum bom conselho para mim!).

Depois de cinco meses aqui em Portugal, pergunto-me porque somente agora fui lá entrar. Moro praticamente em cima de 10 salas de cinema, mas inexplicavelmente em nenhuma havia entrado até então. No Brasil eu costumava ir com bastante regularidade. Acompanhado, sozinho, triste, feliz, sempre estava lá, com a pipoca na mão e a mente pronta para embarcar no trem da fantasia e da imaginação. Ficava ansioso por um novo grande filme. E ficava com pena de assisti-lo, pois não teria mais o prazer de vê-lo pela primeira vez. Foi assim durante muito tempo em minha vida, mas nos últimos cinco meses não sei explicar porque isso se interrompeu.

Talvez seja o mesmo motivo que fez com que eu me afastasse deste blog por tanto tempo. Desde o distante "Meia noite em Paris", no fim de 2011, muitas outras noites (sonhos e pesadelos) se passaram e eu nem aí (aqui?) para o "meu querido blog". Desligar-se do que gostamos pode ser reflexo de algo inconsciente, uma forma de fuga ou punição. No meu caso, podem estar presentes os efeitos de uma droga chamada solidão, potencializada por dias e noites de inverno europeu. Às vezes a vida enguiça, mesmo quando tinha tudo para deslizar calma e suavemente pelos dias afora.

Mas eis que então comecei a me tratar das altas doses a que foi exposto. Ter alguns dos que amo novamente por perto, mesmo que por pouco tempo, me ajudou a ver que o que nos salva é o convívio com aqueles que amamos (e também com quem não amamos). Afinal, o que nos humaniza é conviver, viver com...você mesmo e com os outros!

E estou aprendendo a viver comigo e com meus fantasmas, que inicialmente se fortaleceram sob o efeito daquela droga. Freud falava que "o inferno somos nós", enquanto Nietzsche, ao contrário, afirmava que "o inferno são os outros". Como não há como fugir de nós e nem dos outros, quero e prefiro o paraíso que pode haver no espaço "entre nós", onde habita o amor e todo aquilo que vale a pena nesta vida.

No filme de Scorsese, o pequeno personagem Hugo Cabret também se isolou, viveu em solidão (as razões só assitindo ao filme) numa altíssima torre de relógio de uma grande estação de trem em Paris (novamente Paris...) do início do século passado. Só quando ele decidiu descer da torre e se relacionar com as pessoas que ele só via de longe, em isolamento, é que sua grande aventura começou e com isso pôde encontrar as respostas que procurava.

Não sei ainda o que procuro, muito menos as respostas, mas decidi descer da torre e de agora em diante prometo ir mais ao cinema e escrever com regularidade neste blog. Quem sabe assim, sonhando acordado e escrevendo com prazer, conheço-me melhor!

9 comentários:

  1. Sucinto e tocante.
    Todos nós temos fantasmas que nos assombram.. As vezes somem. Principalmente quando fazemos coisas que gostamos, estamos com pessoas que amamos e/ou esquecemos que eles existem(o mais difícil).
    Ainda não assisti este filme, pois assim como você, nesses últimos cinco meses fui ao cinema apenas uma vez. Mas principalmente por conta da correria.
    Aproveite o cinema(só descer o elevador e dar alguns passos). Aproveite o Mondego para dar aquela importante corrida. Holmes Place é uma excelente opção para desestressar(principalmente se procurar um aeróbico interessante ou retornar à natação), Braga, Porto...
    Agora vem o principal...
    Comece a contagem regressiva para reencontrar duas pessoas que morrem de orgulho de tê-lo como filho. Assim como todos que te conhecem, morrem de orgulho de serem seus amigos.
    Dona Lúcia e Sr Ivanil estão chegando. Com os braços, peito e coração sedentos por um forte, longo e merecido abraço.
    Aproveite-os cada segundo. Tanto para matar a saudade como também para acumular amor por um tempo contigo(faça uma reserva,rs).

    Parabéns pelo retorno(triunfal)do blog.
    Forte abraço!

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  2. "Dorei, fica tisti não,tá!" Nos te amamos muito e estamos sempre pensando em voce, pensamentos positivos! Em breve, como o tempo "voa" estaras sentindo saudades desses dias frios e solitarios.

    Celia Abreu

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  3. Que engraçado amigo,assim como você sai hoje pra assistir só a Hugo num domingo de silencio nas ruas e na alma e vou te confessar q me identifiquei muito com ele.Em algum momento me senti um pouco órfão pelos mesmos motivos que ele e também me perguntando onde encontrar novamente a felicidade plena perdida,essa não volta mais.
    Mas assim como ele do alto da torre temos que aprender a olhar o mundo como uma maquina,e numa maquina nao existe nenhuma peca que nao seja importante ou que nao precise estar lá,portanto meu amigo,vc esta certo,vamos descer da torre e encontrar onde somos a peça fundamental dessa grande nave chamada vida.
    Um grande abraço
    Gustavo Fernandes

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  4. Bingo....mais reflexivo, mais despojado, mais feliz, mais espirituoso, mais realista...de longe ..o melhor do meu amigo porque percebi que vc percebeu q o q nos salva mesmo e descer da torre e encarar de frente tudo q ha de bom e mau na vida...vc e um espectador do mundo. Didatico, encantador, tonitruante...no seu jeito encantador de ser...SAUDADESSSSSSSSSSSSSSSS SEMPRE NELSON

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  5. Bruce, Célia, Gustavo e Nelson (pela ordem da postagem), não sei o que seria deste blog sem a presença (e participação) de vocês. Obrigado pelas palavras de incentivo. Espero merecer e contar com futuras contribuições aqui neste nosso cantinho.
    p.s. "tonitruante" foi o melhor (e incomum) adjetivo que já me foi atribuído. Adoooro!!!

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  6. Silvagner.

    Felini dizia: "O cinema é um modo divino de contar as coisas".
    Esse é o seu momento. Cada dia acontecem coisas que não se repetem. Faça como Hugo Cabret, desça da torre e vá ao cinema para nos contar mais coisas.
    Aqui no Brasil, assisti filmes que gostei muito, como: A Separação, O Artista, Albert Nobbs, A Dama de Ferro, O Porto,Um Conto Chinês, etc...
    Cada filme que assistimos é um encantamento e um aprendizado.

    Abraços,
    Rosa Maria Campos

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  7. "A arte é a mentira que nos revela a realidade"

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  8. Textos que expõem os questionamentos internos são os mais interessantes!

    Se você parar pra pensar, sentar no computador e escrever um pouquinho no blog é estar acompanhado. Você não sabe quem está lá, no entanto é certo que há alguém ouvindo.

    Eu não sei se é o seu caso, mas estar de mudança para outro país deve ser meio impactante. Deve deixar os pensamentos meio desordenados. E demanda tempo colocá-los em fila indiana para, então, transcrevê-los.

    Pretendo ler todos os textos deste blog. Sempre que você estiver falando, pode ter certeza que vai ter alguém por perto! :D

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    1. Márcia,
      Continuo sem palavras para te agradecer. Sim, escrevendo nao estou só. Há um "leitor implícito" que sempre esta comigo. Ele nao se mostra muito, mas eh uma companhia e tanto...
      Abraçao.

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